Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Inês N. Almeida

Inês N. Almeida

Review "A Torre dos Segredos"/ Review "A History of Water"

Inês Nobre de Almeida, 07.03.24

20240303_105043.jpg

 

 

4/5

A História que é passada de gerações em gerações, que perdura durante séculos, foi um dia a melhor versão dos acontecimentos aos olhos de alguém. Essa é a principal mensagem de um livro que me surpreendeu e me pôs a pensar sobre a história do meu país - Portugal - sobre o que é ensinado nas escolas e perpetuado até pelas nossas famílias. 

No último parágrafo do livro, Edward Wilson-Lee escreve: "Há poucas demonstrações deste impulso mais eficientes que o mundo em que hoje vivemos, livre e globalmente conectado como nunca, e, ainda assim, construindo para si mesmo formas de limitar a visão a não ir além do intensamente local e semelhante. Não estivemos sempre aqui, sentados em salas lado a lado, fingindo que estamos num mundo só nosso? Já estavamos no arquivo dos sonhos de John Donne, que há-de unir todas as nossas folhas espalhadas para aquela biblioteca onde cada um dos livros estará aberto para os outros; O desafio, parece, é distanciarmo-nos do que estamos a ler e permitirmo-nos vaguear pelo mundo que nos espera nas prateleiras".

Esta mensagem, tão directa e forte, resume bem este livro. Uma mesma história - a expansão marítima portuguesa para o Brasil, África e Ásia - vista por dois olhares muito diferentes e, assim, ficando para sempre registada também com perspectivas contraditórias.

De um lado temos Luís de Camões, poeta e autor d'Os Lusíadas, um épico que enaltece aquilo que os Portugueses melhor fizeram durante as suas viagens no século quinze e dezasseis. Camões tinha um claro interesse em escrever um texto dessa natureza. "Para um vagabundo como Camões se fazer ouvir entre o ruído e confusão da época, seria necessária uma história com um poder extraordinário" e foi isso mesmo que ele fez. Fora d'Os Lusíadas ficaram os registos de como as populações locais dos pontos a que os Portugueses chegaram reagiam. Um relatório escrito no Camboja descreve os Portugueses como "uma raça de homens com barba que enriquecem espiando outras terras, agindo como mercadores, mas voltando mais tarde para atacar e pilhar como ladrões, que ateiam fogo às nossas casas e campos". 

Do outro lado temos Damião de Góis, arquivista na Torre do Tombo, que tentou sempre deixar registada uma história mais global da expansão portuguesa, com perspectivas muitas vezes contraditórias às que a Monarquia naquela altura queria imortalizar. Nas suas mãos "a história de Portugal e até da Europa começou a descoser-se". Muitos dos seus textos eram banidos no país, no entanto, Damião arranjou forma de dar a volta a esse problema e só assim foi possível que as suas ideias perdurassem até hoje. 

Referindo-se apenas à expansão marítima portuguesa, as ideias incluídas neste livro, de como a História que conhecemos pode apenas ser a melhor versão de certos eventos e não o que ocorreu de facto, são globais. Recomendo muito.

_________________________________________________________________________________________________________________

4/5

The History that is passed down from generation to generation and lasts for centuries was, one day, the best version of events in someone's eyes. That is the main conclusion of a book which surprised me and made me question the History of my own country - Portugal - and about what is taught in schools or perpetuated by our own families.

In the last paragraph of the book, Edward Wilson-Lee writes: "There can be few demonstrations of this impulse more effective than the world in which we now live, which is freely and globally connected as never before, and yet relentlessly constructs for itself ways of limiting its vision beyond the intensely local and similar. Haven't we always been here, sitting in next-door rooms, pretending that we are in a world of our own? We live already in John Donne's dream archive, which shall bind up all our scattered leaves again for that library where every book shall lie open to one another; the challenge, it seems, is to tear ourselves away from what we are reading and allow ourselves to wander through the world that awaits us on the shelves."

This message, so direct and strong, sums up this book. The same history - the Portuguese maritime expansion to Brazil, Africa and Asia - seen through two very different lenses, forever registered with contradictory perspectives.

In one side, we have Luís Vaz de Camões, poet and author of "Lusiads", an epic which highlights what the Portuguese did best during their travels in the 15th and 16th century. Camões had a vested interess in writing such a text. "For a vagabond like Camões to make himself heard among the noise and confusion of the age, would require a story of quite some extraordinary power". That is exactly what he did. Left out of his epic "Lusiads" was the documented view of how local populations reacted to the Portuguese presence. A report written in Cambodia describes the portuguese as "that notorious race of bearded men who enrich themselves by spying out the land, acting like merchants, but returning later to attack and plunder like thieves, who set fire to our houses and fields".

On the other side we have Damião de Góis, archivist in Tombo Tower, who always worked to gather a more global vision of the history of Portuguese expansion, with perspectives which often contradicted those of the Monarchy. In his hands "the histpry of Portugal, and even of Europe, began to come loose at the seams". A lot of his texts were banned in the country. Still, Damião found a way to work around that problem and that's how his documented history lasted until today.

Even though this book only focuses on the Portuguese maritime expansion, its core ideas of how the History we know might be only the best version of certain events are global. Highly recommend!

 

Nervosismo bom e provas de fogo (Good nervewrecking and challenging experiences)

Inês Nobre de Almeida, 10.02.24

20240210_104154.jpg

Escrevo-vos excepcionalmente ao sábado (novo post sairá na quinta-feira na mesma) para partilhar o que fiz hoje pela primeira vez: falei em público sobre o "50 Women in Technology". Não foi exactamente uma apresentação do livro, não era esse o propósito do evento, mas esta manhã estive na Imperial College London a com Megan Hale e Anais Engelmann que entrevistei para o livro a falar para 60 jovens do ensino secundário que pretendem seguir uma carreira nas engenharias ou algo ligado à tecnologia.

Nunca tinha estado numa plataforma (não exactamente um palco) a falar para sessenta pessoas com os olhos postos em mim. O coração parecia que ia saltar pela boca e cair-me aos pés. Felizmente, estava ao lado de duas pessoas muito habituadas a falar em público ao contrário de mim. Ser a primeira a ter de falar não ajudou. No entanto, quando a pessoa a cargo de nos apresentar acabou de o fazer e eu tive de falar sobre como comecei a pesquisar para o "50 Women e Technology" e porque é que é importante darmos destaque aos feitos das mulheres no meio científico, muitos ainda invisíveis, as palavras saíram sem hesitação.

Nem nos trabalhos que fazia e tinha de apresentar na escola me sentia tão à vontade. Nem na peça de teatro em que actuei no décimo segundo ano rodeada de amigos com os quais ensaei durante meses. Talvez a idade ajude, ou ser um trabalho que fiz de raiz. Parte de mim esperava que a idade e ser mais auto-consciente ia exacerbar os nervos. Tudo acabou por correr bem. Enquanto alguém que um dia espera vir a lançar um livro mesmo só seu, de preferência ficção - pelo menos um dos dois que estou a escrever neste momento - ser capaz de enfrentar este medo e subir àquela plataforma foi um momento determinante. Sim, foi aterrador, mas dei a oportunidade e descobri que fui capaz. E agora mal posso esperar por fazê-lo outra vez. O que quero dizer no fundo é: arrisquem a fazer aquilo que vos deixa desconfortáveis! Nunca se sabe o que podem descobrir sobre vocês mesmos. 

_________________________________________________________________________________________________________________

I am writing to you on a Saturday, exceptionally, (regular new post will be here on Thursday as usual) to share with you what I did today for the first time: I spoke in public about "50 Women in Technology". It wasn't a launch, not even an event focused on the book. Still, this morning I was at Imperial College London with Megan Hale and Anais Engelmann, who I interviewed for the book, talking to 60 secondary school students who want to follow a career in engineering or in technology.

I had never been on a platform (it wasn't exactly a stage) talking to so much people with their eyes on me. My heart felt as if it was going to fall out of my mouth at my feet. Fortunately, I was next to two people used to speaking in public, unlike me. Being the first one to have to speak didn't help. Yet, when the person who introduced us finished speaking, I talked about how it was like to research and write "50 Women in Technology" and why it's important to highlight the work of women in scientific fields, a lot of it still barely visible. The words came out with no hesitation.

It wasn't that way when I had to present assignments at school, nor when I had a part in the play we did in 12th grade, in the theatre group, even though I was surrounded by friends with whom I had rehearsed for months. Maybe age helps. Or the fact it was something I made from scratch. Part of me thought age and self-consciousness would exacerbate my nerves. All went well. As someone who one day hopes to launch a book of her own for real, preferably fiction - one of the two I'm writing at the moment - being able to face this fear and to go on that platform was an important moment. Yes, it was terrifying, but I now know I can do it. And I can't wait to do it again. So, I guess what I'm trying to say is: take a chance on yourself. You never know what you might discover!